“É importante que o sujeito preso consiga sair e não voltar para o crime porque quando ele retorna, é com uma potência muito maior”, alerta pesquisador

Mirella Lopes

O Balbúrdia desta quarta (26) começou um pouco diferente, com a jornalista Jana Sá lembrando que há 33 anos os militantes comunistas dirigentes do PcdoB, Glênio Sá e Alírio Guerra, foram mortos em um suposto acidente de automóvel.

Apesar de terem se passado mais de três décadas, para mim, que sou filha de Glênio, e para minha família, é um dia ainda muito difícil. É como reviver, todos os anos, a mesma dor. Pior quando ainda não conseguimos esclarecer as motivações e circunstâncias em que se deu esse suposto acidente. Eu tinha apenas seis anos de idade e cresci ouvindo minha família, especialmente minha mãe, duvidar muito desse acidente”, relata Jana.

Violência no RN

Entre os anos de 2021 e 2022, de maneira geral, a violência diminuiu cerca de 7% no Rio Grande do Norte, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2023, tema da conversa de hoje.

O Rio Grande do Norte saiu de 1.300 mortes violentas para 1.200. Isso parece pouco, mas é muito quando a gente fala de vidas. Muitas vidas foram poupadas de um ano para o outro. Imagine só que, se continuarmos seguindo essa tendência, vamos continuar reduzindo as mortes violentas em 7%, é um avanço que temos conquistado. Infelizmente, ainda temos duas cidades, que estão entre as mais importantes para o estado, entre as mais violentas do Brasil”, lamenta Francisco Augusto de Araújo, cientista social, professor do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) e especialista em Segurança Pública.

O professor se refere a Mossoró, 13ª cidade mais violenta do país, segundo o Anuário de 2023, e São Gonçalo do Amarante, a 40ª mais violenta.

Esse é um ranking que deve envergonhar os gestores públicos. Somos um estado muito pequeno, que não tem a complexidade de um estado como São Paulo”, exemplifica.

Apagar incêndio

O levantamento também aponta que o RN é o 7º estado do Brasil com maior crescimento da população carcerária. Nesse contexto, o jornalista Rafael Duarte, que também participa da entrevista, lembrou que recentemente a governadora do Estado comemorou a ampliação da polícia nas ruas e pagamento de diárias operacionais. Porém, o pesquisador do IFRN avalia que as políticas de segurança pública precisam ser pensadas para além do aparato repressivo.

Quando a gente fala em melhorar a segurança pública, especialmente os crimes violentos, não podemos pensar somente em polícia ou políticas ostensivas, que são aquelas de combate, uma espécie de corpo de bombeiros para apagar um incêndio. As políticas ostensivas têm apresentado alguns resultados positivos, com aumento do número de policiais, concursos com efetivação do aparato técnico, chegada de viaturas, armamentos. Mas é preciso mais do que apagar incêndio. Precisamos fazer com que as pessoas não retornem mais ao mundo do crime. Tudo aquilo que precede a prisão tem funcionado do ponto de vista de repressão ao crime, mas depois da prisão, todas as etapas têm falhado”, avalia o professor do IFRN.

O 7º que mais prende

Você apresentou um dado interessante, nós somos o 7º estado que mais prende no Brasil. Esse é um dado muito triste, ainda mais pelo governo que nos propomos a ser… temos reproduzido a estrutura que sempre criticamos. É importante que o sujeito que passe cinco…seis anos na prisão consiga sair e não voltar para o mundo do crime porque quando ele retorna, é com uma potência muito maior. Ele fortalece as facções criminosas, que têm se expandido para o interior do estado, que é uma das características que dificultam o combate à violência na região Oeste. Temos estudos que já mostram uma parceria entre as facções criminosas da Paraíba e Ceará com as facções do Rio Grande do Norte”, alerta Francisco Augusto de Araújo.

Vítimas dentro e fora da prisão

As vítimas de violência letal nas ruas, fora da prisão, são as mesmas vítimas dentro dos espaços prisionais. 76% são pessoas negras, de cada dez pessoas que morrem, quase oito são negras, o que é muito revelador. 50% das pessoas que morrem vítima de violência no Brasil são jovens, possuem de 12 a 29 anos de idade e é, exatamente, a faixa etária que está presa e 91% das vítimas são homens. Outro dado é que essas pessoas possuem baixa escolaridade. Tenho visto que as políticas dentro dos espaços prisionais são, praticamente, inexistentes. Aqui no RN, lamentavelmente, ainda não há uma política efetiva de assistência educacional. Um sujeito hipotético entra aos 22 anos no sistema prisional, e não vou nem falar que em crime violento porque esse é o menor índice entre os presos, ele é semianalfabeto e foi preso por tráfico de drogas. Se ele passa seis anos preso e chega com o ensino fundamental incompleto, ele não vai ter a possibilidade de completar o fundamental, nem de fazer o médio. Sai alfabetizado no mundo do crime porque cometeu um pequeno tráfico e terá acesso aos grandes traficantes que estão presos. Essa cadeia vai se reproduzindo cada vez mais… Quando ele sair, obviamente vai trabalhar como soldado do crime”, assevera o professor do IFRN e especialista em Segurança Pública.

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